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Os Titãs ainda pulsam: como foi o show em Brasília

Titãs abertura (por Lucas Bolzan)

Texto: Marcos Pinheiro
Vídeos e seleção de fotos: Eliane de Castro
Fotos:
. Lucas Bolzan (colaboração)instagram.com/olucasbolzan
. Sandro Macedo (divulgação)instagram.com/sandromacedofotografia

Um grande frisson tomou conta da mídia e dos fãs quando, em novembro passado, antigos e atuais integrantes dos Titãs postaram em suas redes sociais fotos em preto e branco em poses similares. As especulações viralizaram e se tornaram realidade uma semana depois: a formação clássica da banda paulista – sem obviamente o guitarrista Marcelo Fromer, morto estupidamente num atropelamento em 2001 – iria mesmo se reunir para uma série de 21 shows pelo Brasil ao longo de 2023 comemorando 40 anos de carreira. Euforia geral e uma voraz procura por ingressos logo na abertura das vendas. No roteiro, Brasília estava escalada para o dia 7 de junho, uma quarta-feira (véspera de feriado), em inédita apresentação dentro do Estádio Mané Garrincha, a agora Arena BRB.

5 juntos (por Lucas Bolzan)Tive a oportunidade de assistir alguns shows com o “time completo”, entre eles o impactante lançamento do álbum “Cabeça Dinossauro” na boate Zoom, em 1986, meu primeiro contato ao vivo com os Titãs. Menos de seis anos depois, no saudoso Gran Circo Lar, vi o que seria a última apresentação com Arnaldo Antunes – que deixou a banda em 1992 – na turnê do sexto disco, “Tudo ao Mesmo Tempo Agora”. Aqueles oito caras no palco se movendo em ritmo frenético, o rodízio entre cinco vocalistas e as letras críticas e contundentes eram um combo de sucesso, o melhor show brasileiro da época, pelo menos em se tratando de “mainstream”. A trilogia “Cabeça Dinossauro” (1986), “Jesus Não Tem Dentes no País dos Banguelas” (1987) e “Õ Blésq Blom” (1989) está no patamar de “melhores discos de todos os tempos” do rock nacional.

Nando Reis, Sergio Brito e Tony Belloto (por Sandro Macedo)Entre os céticos, porém, havia uma dúvida: será que aqueles músicos, todos agora sessentões, teriam ainda vigor para aguentar o tranco desse “revival” ou veríamos um show meramente burocrático? A “pernada” iniciada em 27 de abril com três datas no Rio de Janeiro – e que seguiu por Belo Horizonte, Florianópolis, Porto Alegre, Manaus, Belém, Aracaju, Salvador, João Pessoa, Recife e Fortaleza – logo deu pistas de que as expectativas não seriam frustradas. Uma hora e meia antes do horário previsto para o show em Brasília um engarrafamento rondava o estádio, o que obrigou a produção a atrasar o início.

Sergio Brito (por Sandro Macedo)Eram 22h26 quando Arnaldo Antunes, Branco Mello, Charles Gavin, Nando Reis, Paulo Miklos, Sérgio Britto e Tony Bellotto – acompanhados pelo guitarrista e velho parceiro Liminha – subiram ao palco aos acordes da convidativa “Diversão”. “A vida até parece uma festa”, entoou Paulo Miklos, para delírio geral das mais de 20 mil pessoas presentes. E essa primeira parte da apresentação logo mostrou o quanto os Titãs ainda são fundamentais diante do atual cenário de indigência – para não dizer “ausência” – do rock nacional na grande mídia. “Não sou de nenhum lugar, sou de lugar nenhum”, emendou Arnaldo Antunes. “Quem quer manter a ordem, quem quer criar desordem?”, questionou Sérgio Britto. Branco Mello assumiu o microfone principal pela primeira vez para resgatar “Tô Cansado”. Recuperado de cirurgia para retirada de um tumor na garganta, ele comemorou por “ainda estar vivo”. Sua voz (bem) rouca comoveu a plateia, que se sensibilizou e gritou seu nome. As lindas imagens nos telões de alta definição completavam o clima festivo.

Branco Mello (por Sandro Macedo)Em meio aos sucessos radiofônicos oitentistas, os Titãs não se furtaram a pescar pérolas esquecidas – e também essenciais para os tempos sinistros vividos pelo Brasil nos anos recentes. “Não gosto de padre, não gosto de madre, não gosto de frei”, vociferou Nando Reis, o que pode ter incomodado alguns religiosos de plantão. “Estado violência, deixe-me em paz”, clamou Paulo Miklos. “E o pulso ainda pulsa”, garantiu Arnaldo Antunes. Nando lembrou que a banda continuava a cantar o que sempre pensou. E mandou “Jesus Não Tem Dentes no País dos Banguelas” emendada com a emblemática “Nome aos Bois” – com direito à inclusão do ex-presidente Jair Bolsonaro na lista de ditadores e outras personalidades mundiais nefastas (Médici, Stálin, Papa Doc, Mengele, Pinochet, Reverendo Moon, Adolf Hitler, Mussolini…). Juro que não ouvi nenhuma vaia. A primeira parte do show se encerrou com dois momentos de Branco Mello na quase desconhecida “Eu Não Sei Fazer Música” e na minimalista “Cabeça Dinossauro”.

Arnaldo Antunes e Alice Fromer (por Lucas Bolzan)Uma breve pausa e nos telões surgiram imagens dos Titãs ainda jovens em depoimentos resgatados do bom documentário “A Vida até Parece uma Festa” (2008). No retorno ao palco, um já previsto – e desnecessário – set “desplugado”. Se é pra reviver a antiga história, claro que músicas do “Acústico MTV” (1997), “Volume Dois” (1998) e “A Melhor Banda de Todos os Tempos da Última Semana” (2001) também fariam parte do repertório. Mas, depois da contundência inicial, soou para mim como uma ducha de água fria, um anticlímax. O grande público, porém, adorou e cantou a plenos pulmões baladas como “Epitáfio”, “Os Cegos do Castelo” e “Pra Dizer Adeus” – com direito a celulares em punho iluminando todo o estádio. Arnaldo Antunes, ausente desse primeiro momento de “banquinhos e violões” – já que não fazia mais parte da banda nesses discos -, retornou acompanhado por Alice Fromer, filha de Marcelo Fromer. Juntos cantaram “Toda Cor” e “Não Vou Me Adaptar”, dos dois primeiros trabalhos da banda. Com boa voz e simpatia, Alice cumpriu o papel e fez justa e fofa homenagem.

Liminha e Nando Reis (por Lucas Bolzan)Mais um pequeno intervalo e, na volta, Tony Bellotto foi ao microfone para “apresentar” Liminha, produtor da já citada trilogia “Cabeça Dinossauro”, “Jesus Não Tem Dentes no País dos Banguelas” e “Õ Blésq Blom” e dos álbuns “Volume Dois” (1998) e “Como Estão Vocês?” (2003), além de ex-baixista d’Os Mutantes. A terceira parte começou mais pop com os reggaes “Família” e “Go Back” e a versão de “É Preciso Saber Viver”, dedicada ao “gigante gentil” Erasmo Carlos, morto em novembro passado. Teve o resgate da ótima “32 Dentes” e o set foi acelerando com “Flores”, “Televisão”, “Porrada”, “Polícia” e “AA UU”, encerrando com a necessária “Bichos Escrotos”, que saíram de vários esgotos do país em tempos recentes. No “bis”, “Miséria”, “Marvin” (manjada versão para “Patches”, de Ronald Dunbar e General Norman Johnson) e o fechamento com a sintomática “Sonífera Ilha”, de 1984, primeiro “hit” dos Titãs.

Paulo MIklos e Charles Gavin (por Sandro Macedo)Detalhe que talvez tenha passado despercebido: Charles Gavin homenageou o futebol brasiliense vestindo as camisetas verde do Gama e branca do Ceilândia. Talvez um certo ex-senador da República tenha ficado com ciúmes pela ausência do uniforme amarelo local (risos). “Mais uma briga de torcidas, acaba tudo em confusão”

Arnaldo Antunes  (por Sandro Macedo)Sim, os “velhinhos” se mostraram em forma… e bem afiados! A turnê nacional, que também passou ontem (8/6) por Goiânia, segue para Curitiba, São Paulo (com três shows), Vitória e acaba dia 30 de junho em Ribeirão Preto (SP). Em novembro tem apresentação anunciada em Portugal. O que vai acontecer nesse intervalo? Será que eles vão estender por mais cidades? Será que ainda voltam a Brasília até o fim do ano? E o que Branco Mello, Sérgio Britto e Tony Belloto – os três membros ainda oficiais – vão fazer com a banda depois desse retorno triunfal da antiga formação? Só o tempo dirá…

O que podemos afirmar, por agora, é que foi bonito de ver, de lavar a alma. Os Titãs ainda pulsam!

Titãs juntos (por Lucas Bolzan)SET LIST

Parte 1
. Diversão
. Lugar Nenhum
. Desordem
. Tô Cansado
. Igreja
. Homem Primata
. Estado Violência
. O Pulso
. Comida
. Jesus Não Tem Dentes no País dos Banguelas
. Nome aos Bois
. Eu Não Sei Fazer Música
. Cabeça Dinossauro
Parte 2 (acústica)
. Epitáfio
. Os Cegos do Castelo
. Pra Dizer Adeus
. Toda Cor (com Alice Fromer)
. Não Vou Me Adaptar (com Alice Fromer)
Parte 3
. Família
. Go Back
. É Preciso Saber Viver (Erasmo Carlos cover)
. 32 Dentes
. Flores
. Televisão
. Porrada
. Polícia
. AA UU
. Bichos Escrotos
Bis
. Miséria
. Marvin
. Sonífera Ilha

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