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“You shoulda heard him just around midnight”

Foi tudo culpa do Caponildo. Aquele maluco.

Quando os Rolling Stones anunciaram que fariam dois shows em Londres e mais dois (ou três) em Nova York, o meu amigo Marcello Souza, vulgo Caponildo, disse que ia tentar comprar ingressos pela internet.

O brother André Garcia, que é um sujeito predestinado, já estaria em London Town por aqueles dias. Semaninha de férias. Caponildo me perguntou se eu iria também, caso conseguisse comprar os ingressos. Perguntou se eu tinha a grana e tal.

Ah, eu tenho, eu vou, pode crer. Nunca imaginei que ele fosse conseguir mesmo…

Bueno. Nem me pergunte como. O Capa deve ter promovido um ataque hacker que derrubou a Ticketmaster em sete minutos. Mas não sem que, antes, ele tivesse agarrado nossos bilhetinhos da suerte.

Pois… Os Stones deram dois concertos na Arena O2, zona norte de Londres. Jeff Beck participou do primeiro deles. Eric Clapton, do segundo. Mick Taylor e Bill Wyman (foto) se reencontraram com os antigos amigos nas duas oportunidades. Tu já deves ter lido a respeito. Estávamos no primeiro deles, no domingo passado.

Só para te dizer, então, que foi o melhor espetáculo de rock and roll que eu já vi na minha vida.

Desde que os Stones passaram a visitar a América do Sul, tive a felicidade de poder acompanhar todas as turnês deles. Estive no Maraca em 1995. Depois pude vê-los na companhia de Roberto Zimmerman no Rio em 1997, ou 1998, não me lembro bem. E fui até Buenos Aires em 2006.

Nada disso, no entanto, me preparou emocional & espiritualmente para o que eu vi desta vez. A Arena O2 é um lugar relativamente pequeno, em comparação com os estádios por onde os Stones têm circulado nas últimas décadas. E o repertório parece ter sido bolado num momento de imensa generosidade de nossos heróis.

I wanna be your man abrindo o show. Uma das primeiras gravações deles. Uma das primeiras composições de Lennon & McCartney. Eu tenho pra mim que os Rolling Stones comemorarem seus cincoenta anos com uma música dos Beatles é um troço de uma justiça poética mui rara de se encontrar no mundo pop, no hall da fama do rock and roll.

John e George teriam gostado. Paul e Ringo certamente curtiram. E a plateia pôde sentir de imediato que aquela seria uma festinha especial. Teve Get off my cloud. Teve It’s all over now. Teve Paint it black. E eu tive um ataque histérico em Gimme shelter. Não que eu tenha chorado no refrão, claro que não, eu tive uma convulsão.

Mick Jagger deve ter chegado dia desses para o ensaio e, enquanto Charlie Watts lia uma revistinha de jazz, Ronnie Wood e Keith Richards batiam uma sinuquinha, acho que o Jagger deve ter dito algo assim:

- Seguinte, rapaziada, vem gente do mundo inteiro para esta parada e devem vir também uns chatos como o Garcia e o Scartezini. Acho melhor a gente tocar umas velharias logo de cara para esses pentelhos calarem a boca e nos deixarem tocar Start me up e Jumpin’ jack flash sem encher o saco.

Brigado, Mick. Deu certo.

Nem reclamei quando eles tocaram Miss You. Nem quando tocaram as duas músicas novas chatinhas – uma atrás da outra – ninguém reclamou. Nem demos (muito) pela falta de Satisfaction quando eles tiveram de cortá-la do repertoire por já terem passado da hora de dormir e terem ofendido a lei do silêncio na pacata & ordeira noite londrina.

Deu certo demais.

Vou lembrar para sempre do coral colegial que subiu no palco para You can’t always get what you want. E nunca mais vou ouvir All down the line de novo, sem lembrar da homenagem que os Stones fizeram no telão para os mestres que vieram antes deles e para quem os Stones devem as calças: Leadbelly, Muddy Waters, Howlin’ Wolf, Ray Charles…

Vou lembrar para sempre do carinho de Keith Richards ao estender a mão para que Charlie Watts descesse do tablado da bateria ao final do concerto. E nunca mais vou ouvir Midnight rambler de novo, sem lembrar de Mick Taylor, o garoto prodígio que viu tudo lhe acontecer rápido, rápido demais, e que depois nunca pôde se recuperar do tombo que levou.

E também vou lembrar para sempre daquele tiozinho inglês, tão coroa quanto o Charlie, que levou a mulher e as netas para a Arena O2 e permaneceu comportada e britanicamente sentado entre elas durante as duas horas de show. Isso enquanto Garcia e eu pulávamos em júbilo e derramávamos lágrimas de arrebatamento, tal e qual duas adolescentes virgens diante do Justin Bieber.

O tiozinho se manteve sóbrio e composto e sentadinho o tempo todo. Quer dizer, quase o tempo todo. Quando Keith estava a levar Before they make me run, o tiozinho se virou para mim e – mesmo sem me conhecer – mesmo sendo nós dois perfeitos desconhecidos – mesmo ele sendo inglês e eu um transtornado banhado em suor – ele sorriu para mim – ele ergueu os punhos no ar – e deu dois soquinhos de satisfação e euforia incontidas.

Depois se virou pra frente novamente. Ficou cantarolando baixinho até o fim.

3 comentários sobre ““You shoulda heard him just around midnight”

  1. Excelente, espetacular. Nao tava ligado que o Mick Taylor e o Bill Wimann tinham tocado tambem.

    Ao contrario do grande escrtiba, adoro Miss You, adoro JJ Flash e ficaria puto se os caras nao tocassem Satisfaction. Mas nada disso importa. O show foi historico e deu pra sentir isso nas palavras do maior fã de Stones que eu já conheci.

    Saudações!

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